domingo, 20 de julho de 2008

NOTA OFICIAL DO CNC EM DEFESA DA UFES

Esse é o documento final da mobilização em apoio à livre circulação do conhecimento e de bens culturais! Contra o obscurantismo e a mercantilização da cultura. Uma mobilização que nasceu em apoio a UFES - Universidade Federal do Espírito Santo, ao cineclubismo capixaba e ao Cineclube Falcatrua! Somamos até aqui 999 assinaturas! Quem sabe você não será o miléssimo!!! Temos certeza que com um último esforço coletivo poderemos alcançar um número muito maior de apoios institucionais e pessoais. Assim, o documento estará aberto para novas assinaturas até o dia 8 de fevereiro, quando ganhará formatação final e será imediatamente encaminhado à reitoria da UFES e a todos os setores que julgarmos pertinentes. Desde já gratos pelo apoio, apresentamos nossas

Cordiais Saudações Cineclubistas.
CNC - CONSELHO NACIONAL DE CINECLUBES BRASILEIROS

Nota Oficial do CNC - Conselho Nacional dos Cineclubes Brasileiros

Juíza da 6ª. Vara Cível acolhe demanda do Consórcio Europa contra a Universidade Federal do Espírito Santo e cineclube capixaba.

Até quando...?

Até quando juízes obscuros abusarão da justiça em nome de estreitas convicções pessoais que atropelam a legislação e os direitos civis mais elementares?

Por quanto tempo ainda hão de zombar de nós com essa loucura? A que extremos se há-de precipitar essa audácia sem freio? (Discurso de Cícero contra Catilina)

Um dia se revoga a Lei Maria da Penha, por uma pretensa vilania original da alma feminina; em outro, atenta-se ferozmente contra a livre circulação da cultura, tal como prescrita do Código Civil e nas leis que a regulamentam.

"Uma sentença da juíza substituta da 6ª Vara Federal Cível, Renata Coelho Padilha Gera, julgou parcialmente procedente os pedidos indenizatórios do Consórcio Europa contra a Universidade Federal do Espírito Santo por conta do Cineclube Falcatrua. Trata-se de um projeto defendido em curso de extensão da universidade que, em 2004, promoveu exibições públicas de cinema usando cópias de filmes ilegais obtidas através da Internet." (Da redação da Revista Tela)

Em breves considerações, essa sentença fere diretamente o art. 184 do Código Civil, modificado pela redação que lhe deu a Lei 10.695/2003: todas as limitações à exibição ou reprodução de obras culturais, por qualquer meio ou tecnologia, referem-se à sua realização com intuito de lucro, direto ou indireto. "Contrario sensu, é permitida a cópia integral de obra intelectual, sem autorização do detentor do direito autoral, desde que não se vise lucro, seja direto, seja indireto, mas é proibida a cópia não autorizada, mesmo parcial, para fins lucrativos." (Miguel de Almeida, in Revista Consultor Jurídico, 20 de agosto de 2007)

Ora, a exibição do filme em questão, "Farenheit 911", como noticiada, é parte de um curso de extensão daquela universidade federal, realizado com uma entidade sem fins lucrativos – o Cineclube Falcatrua – regulamentada recentemente pela Instrução Normativa no. 63, da ANCINE, sem cobrança de ingresso. A sessão foi realizada dentro do recinto da universidade, pública e igualmente gratuita.

"A juíza considerou que "a autora (o Consórcio Europa) não pode valer-se da violação a direitos autorais ou de propriedade industrial, uma vez que não é a detentora de tais direitos" Mas, contraditoriamente afirma que "ao adquirir a mesma obra, para fins de exibição pública, através de canal não autorizado, causou prejuízo à autora, de ordem patrimonial, uma vez que referido produto só poderia ser adquirido licitamente através da distribuição desta" (Revista Tela Viva).

No entanto, "Pelo Princípio da Reserva Legal, segundo o qual não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia fixação legal, a cópia integral não constitui sequer contravenção. No Brasil, quem baixa arquivos pela internet ou adquire produtos piratas em lojas ou de vendedores ambulantes não comete qualquer ato ilícito, pois tais usuários e consumidores não têm intuito de lucro." (Manuel de Almeida, ibidem)

Mais que isso, a Lei 9.610, "dos direitos autorais", afirma (art. 29, itens VII e VII, alíneas e, g, h e outras) que "cabe ao autor o direito exclusivo de dispor" da obra e sua divulgação. Ora, o próprio Michael Moore, o que é notório, disponibilizou sua obra na Internet, posicionando-se pela sua livre difusão.(*)

Finalmente, o art. 46 da lei dos direitos autorais reforça que eles não podem limitar o uso "para fins didáticos, sem lucro", tal como neste caso, de um curso de extensão universitária.

Caça às bruxas

"O advogado Marcos Bitelli, autor da ação, explica que o Consórcio Europa pediu a abstenção das exibições públicas de obras por ela licenciadas e a destruição dos equipamentos usados para as exibições." (Revista Tela Viva).

Não bastam multas, adjudicadas, mas quer-se a queima dos materiais, dos bens da universidade federal! Por macabra coincidência, justamente do filme que alude ao clássico de Truffaut sobre a queima de livros. No afã de tudo possuir, apela-se para medidas dignas apenas das trevas medievais ou do mais desenfreado fascismo.

Não sentes que os teus planos estão à vista de todos? Não vês que a tua conspiração a têm já dominada todos estes que a conhecem? Oh tempos, oh costumes! Este homem aponta-nos e marca-nos, um a um, para a chacina. (Discurso de Cícero contra Catilina)

A livre circulação dos bens culturais, resguardados os direitos comerciais, é condição essencial para a reprodução do conhecimento, o desenvolvimento da cultura. A criação é um processo contínuo, baseado no cotejo permanente com o patrimônio artístico da humanidade, que não pode ser apropriado por alguns em detrimento da maioria, tal como estabelecem os artigos 19, 27 e 30 da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Tal é origem do conceito de direito autoral, criado para defender autores dos abusos das empresas que controlam a distribuição de suas obras. E não o contrário, limitando o conhecimento e a fruição do saber e da arte em nome da apropriação de lucros presentes e sempiternos. Que, por sua vez, certamente não foram prejudicados pela exibição de um filme numa sala de aula.

Os cineclubes brasileiros apelam a todas as forças da sociedade para se posicionarem contra esse grave precedente, ainda em primeira instância, que atenta contra o direito que tem todo ser humano "de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do progresso científico e de fruir de seus benefícios" (Declaração Universal dos Direitos Humanos).

Através de sua entidade nacional, solidarizam-se com a Universidade Federal do Espírito Santo e com o Cineclube Falcatrua, conclamando particularmente os cineclubes, os cineastas, as entidades culturais e movimentos sociais a se mobilizarem em defesa das liberdades essenciais de livre circulação de idéias, conhecimento e cultura.

É tempo de dar um basta a essa hipocrisia que identifica o comércio pirata com a legítima ação cultural desenvolvida por instituições culturais e educativas amplamente reconhecidas.

É tempo de fazer-se cumprir a lei, nacional e internacional, e não dar espaço a expedientes oportunistas, voltados a beneficiar interesses mesquinhos que querem se apropriar do patrimônio da humanidade, que perseguem e pretendem até queimar os instrumentos de retransmissão do conhecimento e da cultura!

Atividade cultural sem fins lucrativos não é pirataria! Contra o obscurantismo e a destruição de bens culturais! Pela livre circulação da cultura! Pela liberdade de expressão! FILMES SÃO FEITOS PARA SEREM VISTOS!

(*)Não concordo com as leis de direitos autorais e não quero criar um problema com pessoas que querem apenas assistir aos filmes. Enquanto não tentarem lucrar com o meu trabalho, para mim está tudo bem", Roger Moore.

Turbulências latino-americanas


Emir Sader

A América Latina tornou-se o cenário de uma intensa luta entre o velho e o novo, entre um modelo mercantil esgotado, mas que insiste em sobreviver, e a construção de alternativas, que lutam com dificuldades para nascer e se consolidar. Mas é um período em que predominam os ares de mudança positiva.

A direita, derrotada em países como a Venezuela, o Brasil, a Argentina, o Uruguai, a Bolívia, o Equador, a Nicarágua e o Paraguai, foi se recompondo, retomando capacidade de iniciativa, até desatar contra-ofensivas. A primeira se deu na tentativa de golpe de 2002 na Venezuela, protagonizada pela mídia mercantil, que quase conseguiu seu objetivo. Em seguida veio a campanha contra o governo Lula, que teve também a mídia como pivô central. Seguiu-se a campanha separatista na Bolívia, depois foi retomada ofensiva opositora na Venezuela e na Argentina.

O período dominado pela extensão desses governos se prolonga, desde a eleição de Hugo Chavez em 1998, somando já a 8 países. A direita busca, já há anos, a derrubada de pelo menos um deles, para tratar de configurar que essa onda estaria em processo de reversão. Como sucessos, pode contabilizar a vitória de Alan Garcia no Perú e de Felipe Calderón no México, porém nenhum dos eleitos com novas orientações foi derrotado – Chavez, Lula, Kirchner já se reelegeram.

Mas não é apenas nos países que buscam a construção de um novo modelo, que se dão turbulências. A Colômbia continua a ser cenário de guerra, o México assiste a proliferação do mais assustador e preocupante cenário de violência organizada vinculada ao narcotráfico, o Peru presencia grandes mobilizações populares contra o governo, o mesmo acontecendo com o Chile. A turbulência por tanto é hoje a regra geral, apesar do ciclo de expansão econômica que a região vive, fruto das novas políticas, mas também do panorama internacional, até aqui favorável às exportações dos países do continente.

Esse cenário de instabilidades se deve a um choque entre um modelo econômico que se esgotou, desde que afetado por graves crises nas três principais economias da região – México 1994, Brasil 1999, Argentina 2001-2 -, como seu reflexo mais expressivo, e as dificuldades para a construção de um novo modelo.

Depois de ter conseguido contornar os processos inflacionários, o neoliberalismo não foi capaz de impor um novo ritmo de crescimento às economias dos nossos países. O governo de FHC é um exemplo claro disso: depois da lua-de-mel da estabilidade monetária, transformada em dívida pública, sucedeu-se um processo recessivo, com três quebras da economia – e suas correspondentes Cartas do FMI -, situação de que apenas recentemente o Brasil conseguiu sair.

O futuro da América Latina na primeira metade do século se joga neste anos, na dependência da consolidação desses novos tipos de governos – com suas diferenças internas de orientação, mas com oposição comum aos TLCs e privilégio dos processos de integração regional -, tanto no avanço para modelos pós-neoliberais, quanto no aprofundamento e extensão das distintas iniciativas de integração regional.

O referendo sobre os mandatos do presidente, do vice e dos governadores na Bolívia, dia 10 de agosto, é o próximo grande enfrentamento na região. Se for vitoriosa a oposição – possibilidade menor atualmente -, a direita terá contabilizado uma primeira reversão na tendência geral da última década no continente.

Vitorioso, Evo Morales poderá renegociar o projeto de nova Constituição, em condições favoráveis, bloqueando as tentativas exacerbadas de autonomismo dos estados orientais do país e impedindo a tentativa destes de impedir que a reforma agrária afete suas bases de poder, incluindo a eventual substituição de alguns dos governadores que hoje fazem oposição ao governo boliviano.

Em seguida, em abril de 2009, será a vez dos governos progressistas terem a possibilidade de aumentar sua lista de presidentes, com a provável vitória de Mauricio Funes, da Frente Farabundo Marti de Libertação Nacional, em El Salvador. Por tudo isso, são anos decisivos para a fisionomia que a América Latina apresentará na primeira metade do novo século.

A anistia de Flávio Koutzii


A Caravana da Anistia, do Ministério da Justiça, realizou quinta-feira (17), em Caxias do Sul, durante o Encontro Nacional de Estudantes de Direito, o julgamento de uma nova série de processos de perseguidos políticos durante a ditadura militar. Flávio Koutzii foi um dos que recebeu as desculpas oficiais do presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão Pires Jr. “Não se trata de benesse, bolsa ou privilégio”, ressaltou Abraão. Koutzii teve reconhecido seu diploma de Sociologia da França, o direito de retornar ao último semestre de Economia na Ufrgs, além de uma indenização de R$ 2 mil por mês, continuamente, retroativo aos últimos cinco anos. Muitos petistas acompanharam o julgamento, entre eles o deputado federal Pepe Vargas, a deputada estadual Stela Farias e o vereador de Porto Alegre, Marcelo Danéris.

Durante a ditadura militar, Flávio Koutzii foi processado com base na Lei de Segurança Nacional e teve seus direitos políticos cassados por dez anos. Acabou se exilando no Chile e, mais tarde, na Argentina, onde foi preso na Operação Condor. Flávio passou quatro anos encarcerado em várias prisões da Argentina (de 1975 até 1979), acusado de pertencer a organizações clandestinas, condenado a seis anos e solto graças a uma grande campanha internacional de solidariedade. Ele fez um relato sobre esse período no livro “Pedaços de Morte no Coração” (L&PM, 1984). Após sua libertação, Koutzii foi para a França. Em 1984 retornou finalmente ao Brasil e retomou suas atividades políticas, sendo eleito vereador em Porto Alegre, deputado estadual e, posteriormente, indicado para a chefia da Casa Civil do Estado do Rio Grande do Sul, durante o governo Olívio Dutra (PT).

Foto: Ireno Jardim

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